#8 dizer que só existe crescimento no desconforto vai deixar todo mundo maluco.
sobre mudanças que fazem os outros perguntarem “mas por que você fez isso”? e fazem você querer responder “porque eu quis”.
eu tenho um carinho gigante por essas mudanças que não dá vontade de sair falando por aí. tipo terminar um namoro de 10 anos, ficar com o melhor amigo e se demitir do emprego que você dizia que amava. minha favorita é cortar o cabelo curto, porque é algo que eu posso fazer anualmente e ainda assim receber a mesma reação do público.
você acha que na quarta vez que você corta o cabelo curto as pessoas deixam de se decepcionar, certo? errado.
ps: esse rascunho já estava iniciado antes do ep. de gostosas também choram dessa semana sair. mas ele saiu com a mesma temática, então não posso deixar de por o link aqui:
eu não sei porque isso pega tão mal as pessoas, a cara de dó que fazem de apego por um cabelo que nem é deles. ou a cara de desaprovação pela escolha em não performar feminilidade com o cabelo longo e sedoso. quase tenho que me desculpar por querer ser prática, querer poder lavar meu cabelo em 10 minutos (eu cronometrei) todos os dias. em todos os quatro anos (rumo ao quinto agora) que tive cabelo curto, nunca encontrei a justificativa que as pessoas que sentem dor física ao verem meu cabelo mais curto procuram - em especial minha mãe. quase não tem como ganhar essa.
na verdade, às vezes eu acho que sou a única apreciadora das mudanças que vem pelo plot. eu sou a amiga que vai falar “termina mesmo” ou “tranca o curso sim”. só nunca havia dito nada disso para mim mesma, até então. eu nunca me dei o aval da “escolha errada”, a escolha que é o passo para trás que vai chocar (ou decepcionar) todo mundo.
só que sendo bem sincera eu cansei de tentar manter a pose e provar algo para os outros. agora estou agindo meio como uma foragida, sendo ausente, egoísta e esquisita enquanto planejo meus próximos passos em segredo.
pela primeira vez, eu percebi que estava descontente com a minha vida e fiz um follow up comigo mesma antes de pedir a opinião de qualquer outra pessoa. e a partir daí se sucederam escolhas que eu estou bancando, mas não necessariamente estão sendo bem recebidas pelo público (e olha que o público é seleto).
o que eu andei fazendo:
excluí minhas redes sociais. deixei só o instagram, depois de remover 900 seguidores. e não to postando nada lá - então 900 pessoas ainda não sabem que foram removidas. eu acho.
me afastei de quase todo mundo (o que talvez seja meio um erro, mas foi o que eu consegui fazer)
voltei a escrever e comecei a publicar o que escrevo
estou pensando muito sobre o que quero profissionalmente
me mudei, depois de quase 6 anos.
o elefante na sala
consegui encontrar uma mudança que as reações são ainda piores do que com relação a todas as supramencionadas.
achei que era coisa das comédias românticas, mas falar “vou voltar a morar com os meus pais” é comicamente mal recebido na vida real também.
foi uma decisão majoritariamente financeira, é o que direi. na verdade, foi por medo de ficar maluca. foi por gostar de ter um quintal. sendo por um, por outro, ou por ambos: de qualquer modo não é bonito dizer que decidi e estou feliz com uma decisão que (de acordo com os outros) é um passo para trás. quem em sã consciência escolheria deixar de morar sozinha em uma cidade relativamente grande? deve estar maluca - pode ser que sim.
eu tenho muita sorte por ter um lugar para voltar quando não tô bem. e eu não estou bem. já mencionei em várias edições da newsletter que andei me sobrecarregando - e até me maltratando, se formos ver. não estou dizendo que vai ser mil maravilhas, já sei que vou discutir diariamente sobre coisas bobas com meus pais. mas é ótimo ter com quem você se importe o suficiente a ponto de discutir sobre algo.
voltar a morar com os pais, em uma cidade pequena, é o contrário de largar tudo e tentar uma carreira em são paulo. é por saúde, é admitir que estou com o copo cheio demais e não to dando conta. nossa, mas tão jovem e não está dando conta? ah, a glamourização do aproveitar a vida enquanto se é jovem! que não inclui desacelerar, mas inclui trabalhar como PJ sei lá quantas horas por semana, pegar transporte público e jantar sozinho na mesa e, no final de semana, se jogar na vida noturna, beber, comer mal, dormir pouco e gastar muito dinheiro. não é a toa que todo mundo tem ansiedade.
para a surpresa de grande parte das pessoas que tem 20 e poucos anos, eu posso aproveitar a vida sóbria, acordando 05 da manhã, daqui do quarto que existe desde antes de eu nascer, lendo meus livros, sem usar o instagram sabia? ah, e eu também posso tirar tempo para me conhecer. não me venham enfiar o lifestyle sociedade do cansaço goela abaixo.
o sucesso tem uma cara específica para as pessoas, né. e essa cara pode ser de esgotamento total - desde que não seja dado um passo para trás.

queria saber quem anda convencionando o que é o convencional, quais caixinhas a gente tem que ir ticando. porque supostamente nós somos muito menos tradicionais que nossos pais - ou nós somos conservadores como nossos avós considerando que ando ouvindo uns discursos sobre “ter que aguentar”: aguentar o curso que escolhi, aguentar o trabalho, só aguentar. escrever? passar fome.
a epítome para mim, quando vi que algo estava errado, foi um sábado em que acordei com uma cólica muito forte, absurdamente desconcertante que facilmente seria um apendicite. mas não no meu mundinho - não poderia ser, eu não ficaria doente e estragaria minha rotina. tomei luftal em cima de luftal e segui o dia, fiz esteira, fiz as coisas na rua, suando de dor. não comuniquei ninguém sobre. só avisei no dia seguinte, informando que havia passado por fortes dores - mas não havia morrido. há! mais uma vitória de mim contra eu mesma.
genuinamente, eu achava que tínhamos passado do momento de normalizar algumas coisas. normalizar a dor, romantizar o sofrimento. mas nós como chefes de nós mesmos estamos nos saindo piores do que nós como subordinados dos outros. estamos sendo super duros, inflexíveis. o no pain no gain está indo longe demais. quer exemplo melhor do que eu, que não me permito nem ficar doente? a intenção é se ferrar um pouco para chegar em um lugar melhor depois. só que você também não precisa se ferrar em tudo, poxa. abdicar de tudo e escolher a dor, para se sentir superior em comparação à pessoa que tá levando tudo isso de boa.
eu sinto tanto por existir em um momento em que tudo é tão fragmentado que o não convencional não tem mais força nenhuma. parece que voltamos para a meta: vestibular, curso tradicional, um emprego, casamento, filhos, aposentadoria - exatamente nessa ordem.
não é a toa que os gen zs tem uma dificuldade absurda com questões identitárias: não existe contracultura. não existe o movimento hippie. existem trends, estéticas, que duram duas semanas, são individualistas (e levianas), não promovem o senso de pertencimento, não tem idealismo nenhum.
meu ponto é: a geração dos meus avós acreditava que devia haver um emprego para a vida toda. a geração dos meus pais acredita em possibilidades. a minha geração, pelo visto, acha que só existe crescimento no desconforto.
e é meio isso mesmo, mas com a intenção de sair desse desconforto em algum momento: ter a vida corrida agora para descansar depois. morar na cidade merda para depois morar na praia. ter 5 dias corridos, para ter 2 dias calmos. pelo menos para mim, seria assim. eu cansei do masoquismo de me anular para atender as expectativas dos outros, de ter que dar conta de tudo sozinha e ainda mostrando como eu sou boa em dar conta de tudo sozinha.
falta um acolhimento, eu acho. acho que essa edição é o último ato de uma peça composta pela #4 movimento de volta ao básico que funciona e a #7 tenho a impressão que todo mundo queria jout joutar. também acho que estou dando satisfação demais por aqui.
de qualquer forma, tirando todos os pesares, tirando o fato que estou sentindo fisicamente as mudanças (dor de cabeça, dor no corpo, dor de barriga e cia) embora emocionalmente eu me sinta como uma porta, como se nada tivesse mudado, eu sou fã de mudar.
eu gosto do novo. eu gosto de acreditar em coisas melhores. eu não tenho medo. mas é uma das primeiras vezes que a mudança não é em contra direção à doidera. é a mudança para um lugar conhecido, em que posso me permitir estar com o estômago péssimo e tem sopa feita de noite e pessoas que podem ir comprar gatorade para mim.
e, sendo bem sincera, a resposta “porque eu quis” vai ter que começar a bastar.
Me identifiquei muito com o seu relato. Acho engraçado que algumas decisões “chocantes” que tomamos já estavam tomadas em nós mesmos há algum tempo. Tudo tem a ver, até demais, com a expectativa social. Um abraço
O "porque eu quis" é uma das minhas metas pra 2025! A gente sabe o que é melhor pra gente, e se não der certo é só mudar de novo hehe boa sorte nessa jornada! Nada melhor do que ser cuidado quando necessário